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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

VOCAÇÃO PARA AGIR

Foto: ©DIVULGAÇÃO
A educadora Yvonne Bezerra de Mello é uma das maiores ativistas sociais do Brasil. A experiência de ajudar as crianças vítimas da Chacina da Candelária, em 1993, mudou sua vida. Foi a partir dessa tragédia que ela descobriu que precisava fazer mais pelos meninos e meninas de rua. Hoje, ela divide com os leitores de Seleções o que aprendeu ao longo da jornada.
Pensamento positivo
Desde muito pequena, minha mãe me ensinou que o pensamento positivo sobre todas as coisas que acontecem na vida é a chave para o equilíbrio e o sucesso. A palavra “NÃO” inexistia em nossa casa e toda vez que havia resistência ou limites, eles me eram explicados para que eu entendesse a situação. Esse entendimento de que não existem problemas, mas soluções, norteou minha infância, adolescência e ainda hoje me influencia.
O começo de tudo
Meu primeiro trabalho social foi aos 12 anos, quando parava para conversar com os meninos que ficavam na rua perto da minha casa. Ficar com eles tornou-se uma rotina e acabei criando uma banca de revistinhas infantis que eu lia e expunha com eles na calçada para fazer dinheiro e ajudá-los a comprar comida. Aos 13 anos, fui ler para crianças cegas como voluntária, e minha felicidade de poder mostrar e fazê-las perceber o mundo, a cultura e a vida através da minha voz e dos meus olhos era enorme.
A obrigação de ajudar
Outra coisa que aprendi desde cedo foi o desprendimento das coisas materiais. Minha mãe me dizia: tenha somente o que você precisa para viver dignamente. E ressaltava: desde o momento do nascimento, começa a luta pela sobrevivência e, quando você equilibra sua luta, tem de lutar pelos outros.
Também é sua obrigação como ser humano ajudar seu país. Use sua mente, seu cérebro, seu conhecimento e passe suas experiências positivas àqueles que não tiveram a sua sorte. Ensine aos outros o que aprendeu e faça com que muitos sigam os seus passos na luta pela inclusão de todos os seres humanos na via do aprendizado.
Entender a própria dor
O constante trabalhar no entendimento da vida me ajudou a compreender o abandono de um pai que nunca se fez presente. Isso também me ajudou a construir as bases da sobrevivência em múltiplas situações no decorrer dos anos. E o que aprendi foi: é necessário compreender para aceitar.
A solução pela educação   
O trabalho voluntário no Nordeste do Brasil nos anos 1960 e na Europa e na África na década seguinte me fez entender a situação das crianças que não conseguem aprender nos países em guerra, nas cidades violentas e nas ruas. A vida nesses locais traz consequências devastadoras ao desenvolvimento físico e biológico de crianças e adolescentes. Entender e encontrar soluções pedagógicas para transtornos emocionais e consequências no aprendizado, o impacto na sociedade, na saúde pública e o seu custo social se tornaram para mim uma busca incessante.
Os anos de universidade e pesquisa me ensinaram que aquele que transige nas suas ideias é um sério candidato à mediocridade. Passei a perseguir cada vez mais o objetivo: evitar que milhões de crianças se tornassem subempregados, trabalhadores infantis e que nunca tivessem um lugar de destaque nas sociedades de diversos países.
Aprender para agir
De nada servem os estudos e pesquisas se não passarmos à ação. É a ação que move montanhas e que leva o homem a criar, construir e melhorar sua existência e a dos outros. Depois da chacina da Candelária, abri a primeira sala de aula do Projeto Uerê, uma escola alternativa, debaixo de um viaduto, para 150 crianças e jovens. Foi quando entendi que para fazer o bem não é necessário, num primeiro momento, ter fundos. A vontade ultrapassa todo o dinheiro do mundo. É preciso fazer, deixar seus impulsos se tornarem realidade. Descobri que nada é impossível quando realmente se quer alguma coisa.
O poder da perseverança
Os quatro anos que passei debaixo da ponte, educando em condições difíceis, me faziam pensar em todas as crianças que nunca foram a uma escola, outras que tinham aulas sob uma árvore, outras cuja vontade de estudar era tão forte que andavam quilômetros para encontrar um professor. Isso a África me ensinou: perseverança acima de tudo.
Yvonne Bezerra de Mello é autora de diversos livros, entre eles estão Águas que dançam (Editora Francisco Alves, 2004), Para mim chega (Record, 1997) e As ovelhas desgarradas e seus algozes (Civilização Brasileira, 1995).
fonte: Revista Seleções

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